Goiânia e São Paulo, as cidades que perderam seus prefeitos

Cileide Alves
3 min readMay 16, 2021

O então candidato Maguito Vilela (MDB) estava hospitalizado em estado grave e a probabilidade de que morresse era alta. Ainda assim elegeu-se prefeito de Goiânia. Bruno Covas, prefeito de São Paulo, tinha um câncer agressivo. Mesmo magro e debilitado, decidiu se candidatar e reelegeu-se. Agora, muita gente se pergunta: por que goianienses e paulistanos os elegeram mesmo sabendo do risco de morte? Talvez a pergunta seja outra: quem sabe sobre morte de alguém?

Não sei exatamente como os fatos se sucederam em São Paulo, mas em Goiânia o eleitor tinha informações diárias sobre a doença de Maguito pelos boletins divulgados pelo Hospital Albert Einstein. Se um ET desembarcasse hoje em Goiânia e lesse todos esses boletins não se assustaria com o desfecho do caso. Em dado momento a coordenação da campanha de Maguito chegou a falar na possibilidade de substituir o candidato (quando ainda havia prazo legal para isso), mas concluiu a troca seria admissão de sua morte. Tema difícil para a família e de ser abordado por adversários e pela imprensa.

Diferentemente de Maguito, Bruno Covas estava consciente na campanha. Talvez tenha faltado questionamentos sobre sua capacidade física de administrar uma cidade do tamanho de São Paulo. Todavia é impossível ir além disso pelo simples motivo de ninguém de nós sabe quando uma pessoa vai morrer. Bruno poderia ter vivido mais alguns anos e cumprido seu mandato, afinal, quantas pessoas conhecemos sobreviveram mais tempo combatendo um câncer tão agressivo? Esse é o ponto: não controlamos a morte. Ninguém tem essa certeza para exigir nada do outro.

Agora as duas cidades vivem o luto das perdas e a aflição de terem prefeitos que não elegeram, sem legitimidade política. Nesses casos (há mais exemplos pelo país de prefeitos que morreram pela covid-19) nada mais há o que fazer, mas é preciso pensar no futuro. Talvez a saída seja mudar a legislação e convocar novas eleições se o titular morrer antes de ele completar determinado tempo de mandato, como ocorre em casos de cassação. As histórias de Goiânia e de São Paulo poderiam provocar esse debate.

Depois do imponderável acontecer (as mortes de Maguito Vilela e Bruno Covas abordadas no post anterior), quem chega ao poder por vias trágicas e em tão pouco tempo depois do calor das emoções eleitorais (Maguito morreu 13 dias após a posse e Bruno, 4 meses e meio depois) precisa de sensibilidade para entender o momento histórico que os levou até ali para compreender o sentimento do eleitor e o papel a desempenhar. Ricardo Nunes (MDB), o vice-prefeito de São Paulo, fez neste domingo (16) a mesma promessa do então vice de Goiânia, Rogério Cruz (Republicanos) após a morte de Maguito: vai manter a equipe de Covas e seus programas de governo. Será? A ele o benefício da dúvida.

Em Goiânia não foi o que aconteceu. Neste domingo eu me encontrei com uma vizinha na praça onde ficam nossos prédios. Ela me contou que Cruz tinha participado de uma reunião com os moradores do entorno da praça no dia anterior. Jornalista curiosa, perguntei como foi a reunião e sobre a participação dele. Ela me respondeu:

- Não sei, eu estava caminhando quando vi vários carros pretos parando em volta dos moradores reunidos. De dentro de um dos carros saiu um homem com o ego muito inflado e imaginei que fosse o prefeito.

Minha vizinha não se interessou em parar nem em conhecer pessoalmente o prefeito que ela nunca tinha visto. Isso me fez lembrar de um vídeo dele e de sua mulher, publicado em seu perfil no Instagram na sexta-feira (14). Eles fizeram um jogral para comemorar o dia do gari. Pareciam dois adolescentes deslumbrados quando escolhidos para discursar em nome dos colegas na solenidade de formatura.

Moral da história: a conquista de um mandato sem o teste das urnas abre uma oportunidade ímpar na carreira de qualquer vice, mas impõe-lhe muitos desafios. Cargo algum o investe de liderança, de capacidade de gestão e de carisma nem o torna uma celebridade amada pelo público. Isso se conquista com muito trabalho, resultados, serenidade e maturidade políticas.

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Cileide Alves
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Written by Cileide Alves

Jornalista e mestre em História. Coapresentadora na Rádio Sagres e colunista do jornal O Popular. Autora do livro “Iris Rezende-De líder estudantil a governador

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